História de Ítalo Calvino
Certo dia, depois de pensar muito, um jovem disse:
– Não me agrada muito essa história de que um dia todos devem morrer, quero procurar a terra onde nunca se morre.
Ele despediu-se dos seus pais e de toda a sua família e saiu pelo mundo para encontrar esse lugar. O moço perguntava às pessoas sobre a existência desse lugar, mas ninguém sabia informar onde era.
Um dia ele encontrou um velho que tinha a barba branca até o peito e que empurrava uma carroça cheia de pedras. Perguntou a ele:
– Sabe me indicar onde é o lugar em que nunca se morre?
– Não quer morrer? Fique comigo. Enquanto eu não tiver terminado de transportar com a minha carroça toda aquela montanha, pedra por pedra, você não há de morrer.
– E quanto tempo vai levar para desfazer a montanha?
– Vou levar cem anos.
– Depois deverei morrer?
– Não há outro jeito.
– Não, este não é o lugar para mim, quero ir a um lugar onde não se morra nunca.
Ele agradeceu ao velho e seguiu o seu caminho.
Depois de muito andar, chegou a um bosque onde encontrou um velho que tinha uma barba branca até o umbigo e cortava galhos com uma podadeira, perguntou a ele:
– Sabe me indicar onde é o lugar em que não se morre nunca?
– Fique comigo – disse-lhe o velho – Enquanto eu não tiver cortado o bosque inteiro com a minha podadeira você não há de morrer.
– E quanto tempo vai levar?
– Hum! Duzentos anos.
– E depois deverei morrer do mesmo jeito?
– Certamente.
– Não, este não é o lugar para mim, vou em busca de um lugar onde não se morra nunca.
O jovem seguiu o seu caminho e depois de muito caminhar chegou na beira do mar. Lá ele viu um velho que tinha uma barba branca até os joelhos. O velho observava um pato que bebia a água do mar. O jovem perguntou:
– Por favor, conhece o lugar onde nunca se morre?
– Se tem medo de morrer, fique comigo. Enquanto este pato não tiver enxugado o mar com seu bico, você não há de morrer.
– E quanto tempo vai levar?
– Trezentos anos.
– E depois será preciso que eu morra?
– E o que pretende? Quantos anos mais gostaria de viver?
– Este lugar não serve para mim, tenho que ir para onde não se morra nunca.
Retomou o caminho e uma certa noite chegou a um palácio magnífico. Bateu, e quem abriu foi um velho com a barba até os pés, ele falou ao velho:
– Estou à procura do lugar onde não se morre nunca.
– Então acertou. Este é o lugar onde nunca se morre. Enquanto ficar aqui comigo, esteja seguro de que não morrerá.
– Finalmente! Andei um bocado! Este é exatamente o lugar que eu procurava.
– Fique comigo e me faça companhia.
Muitos e muitos anos se passaram e os dois viviam bem, mas o jovem sentiu saudade dos seus parentes e falou ao velho:
– Gostaria de ver como estão os meus parentes.
– Mas que parentes você quer ver? Depois de todos estes anos já estão todos mortos.
– Bem, então gostaria de ver minha terra natal, quem sabe não encontro os filhos dos meus irmãos.
– Se quer mesmo isso, está bem, vá até à estrebaria e pegue o cavalo branco, que anda como o vento, mas lembre-se de jamais descer da sela, ou então morrerá no mesmo instante.
Então o jovem saiu em sua viagem de volta à sua terra. No caminho passou por uma grande planície, onde antes havia um mar e percebeu que o velho da barba nos joelhos havia morrido. Depois de muito andar chegou a um grande descampado onde antes havia um bosque e percebeu que o velho da barba no umbigo já havia morrido. Andou por mais um tempo e encontrou uma outra planície onde antes havia uma montanha e percebeu que o velho que tinha a barba no peito também já havia morrido. Sentiu-se aliviado por não ter ficado com nenhum deles.
Enfim, ele chegou à sua terra natal, mas tudo estava mudado, não reconhecia mais nada, procurou por parentes, mas ninguém tinha ouvido falar de nenhum deles. Sentiu-se triste, sentiu saudade, procurou a vida inteira fugir da morte e tinha conseguido, mas será que havia vivido realmente?
Resolveu voltar quando se deparou com um velhinho que conduzia uma carroça que estava emperrada, cheia e sapatos velhos, e o velho falou:
– Senhor, faça uma caridade, desça um momento e me ajude a levantar esta roda, que saiu fora da trilha.
– Tenho pressa, não posso descer da sela — disse o jovem.
– Conceda-me esta graça, veja que estou sozinho, a noite vem chegando…
O jovem ficou com pena do velho e desmontou. Ainda estava com um pé no estribo e outro no chão quando o carreteiro o agarrou por um braço e disse:
— Ah! Finalmente o peguei! Sabe quem sou? Sou a Morte! Está vendo todos aqueles sapatos furados ali na carroça? São todos os que me fez gastar para correr atrás de você. Agora consegui! Todos têm que acabar nas minhas mãos, não há escapatória!
E ao jovem que não tinha vivido só restou aceitar e morrer.
Conselho de vó: Não tenha medo da morte, tenha medo de nunca viver de verdade!
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Lembro-me muito bem,
Eu tinha por volta de seis ou sete anos quando ouvir essa história na escola pela primeira vez…
Ela nunca saio da minha cabeça hje com trinta anos planejo contar para meus filhos, para que eles tenham uma experiência de leitura assim como eu…
Que quando era criança achava que realmente existia esse palácio onde nunca se morria,
Mais o final do texto nos deixa a refletir que realmente o bom da vida é viver cada segundo dos nossos dias como se não houvesse amanhã… pois a morte é a certeza que todos nós temos, uns mais cedo outros mais tarde mais o que não podemos é deixar de viver cada segundo como o último das nossas vidas para que não venhamos nos arrepender na hora da morte.